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Em novo álbum, Eagle-Eye Cherry troca a reinvenção pelo ofício
Cantor sueco traz um pop de voz e violão que prefere companhia a espetáculo, e acerta o tom com farol baixo e estrada longa.
Por LockDJ
Publicado em 27/09/2025 19:58 • Atualizado 27/09/2025 20:00
Música
Eagle-Eye encontra a maturidade em faixas redondas, de estrada e coração aberto (Foto: Divulgação)

Eagle-Eye Cherry volta enxuto e direto em Become a Light, um disco curto (nove faixas) que aposta no velho trunfo do artista: canções de pop/rock melódico com centro de gravidade na voz, violões bem à frente e refrões que grudam sem abusar do açúcar. É um álbum de “pequenas iluminações”, sem reinvenção dramática, e justamente por isso ele funciona como companhia confiável para quem ainda associa o sueco a canções de estrada e ao lirismo pé-no-chão.


A abertura com “Chasing Down a Dream” define o tom de ritmo pulsado, guitarras limpas em arpejos e um refrão ascendente que fala mais de persistência que de epifania.

Em “Just Because”, Cherry dá aquela inclinada soul que sempre frequentou o seu repertório, com um groove macio e backing vocals usados como pinceladas, não como muleta. Já “Hate to Love” é o flerte mais evidente com o radio-friendly: bateria seca, estrofe em dinâmica contida e explosão medida no refrão. Cálculo pop feito com elegância.

O meio do álbum guarda o que ele tem de melhor. “Long Way Home” é estrada pura: andamento de meia-roda, violão dedilhado, baixo arredondado e uma harmonia que parece familiar sem ser derivativa. “Call This Love” abre espaço para a vulnerabilidade, com letra menos figurativa e uma melodia que pede canto próximo do falsete. É o momento em que Cherry soa mais exposto, e também mais expressivo. “Remember What You Did Last Night” injeta humor e autocrítica numa noite torta: é a faixa que equilibra leveza narrativa e arranjo preciso, lembrando que o cantor sabe contar histórias sem soar autocentrado.



Quando decide arriscar um pouco o timbre, o disco cresce: “Salt in the Wound” adiciona textura áspera aos violões e um piano seco que dá lastro ao refrão. A canção mais “adulto contemporâneo” do conjunto, no melhor sentido. É aqui que se sente o cuidado de produção. Nada sobra. As camadas entram e saem para servir a canção, não para inflá-la. Essa economia sonora é virtude e limite. Quem espera arestas mais experimentais talvez sinta falta de risco.


Tematicamente, Become a Light é um trabalho pós-ressaca, atento às pequenas alegrias e aos remendos do cotidiano: seguir em frente, pedir desculpa, recomeçar. Cherry escreve como quem conversasse com um amigo no banco do carona, e isso pede uma voz que não canse. Ele entrega. O timbre envelheceu bem, ganhando um grave mais quente e um agudo menos ansioso.

Os tropeços são discretos. Algumas pontes parecem “default Eagle-Eye”, como se o piloto automático do ofício tomasse o volante por segundos. Em duas faixas, a mixagem privilegia tanto o violão que a bateria perde presença, e se torna um detalhe que rouba impacto nas viradas. Ainda assim, o álbum passa sem filler. É curto, redondo, revisita marcas do artista e evita a caricatura nostálgica.

No balanço, Become a Light não pretende disputar revolução, apenas oferece constância. É um disco de canções bem resolvidas que preferem brilhar de perto, não ofuscar. Para quem chegou por “Save Tonight” e ficou pelos trabalhos recentes, é uma síntese madura, com menos urgência juvenil, mais respiro e craft.

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