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Slash 60: seis décadas sob o chapéu, a cartola e o peso das cordas
Guitarrista lendário sintetiza uma trajetória que vai muito além dos solos de arena.
Por LockDJ
Publicado em 23/07/2025 06:00
Música
Slash ajudou a fundar uma linguagem que flertava com o perigo (Foto: Reprodução)

Num tempo em que a cultura do exagero forjou lendas sobre decadência e glória, Saul Hudson — mais conhecido como Slash — firmou-se como uma das imagens mais reconhecíveis da guitarra elétrica do século XX. Ao completar 60 anos nesta quarta-feira, 23 de julho, o guitarrista sintetiza uma trajetória que vai muito além dos solos de arena: é uma linha contínua entre os becos sujos de Los Angeles, o virtuosismo improvisado e o imaginário de uma geração que aprendeu a reconhecer heróis pela silhueta.

 

Nascido em Hampstead, Londres, e criado nos Estados Unidos, Slash cresceu cercado pela atmosfera da indústria cultural. Filho de uma figurinista que trabalhou com David Bowie e de um artista gráfico da Geffen Records, encontrou na guitarra um veículo de expressão em meio ao caos urbano dos anos 80. Com o Gibson Les Paul colado ao corpo e a cartola como assinatura estética, atravessou os palcos com o Guns N’ Roses, tornando-se figura central de uma era em que MTV, vinil e comportamento colidiam.

 

É no álbum Appetite for Destruction (1987) que Slash se torna símbolo. O riff de "Sweet Child O’ Mine", criado quase por acidente, ecoou nos bares e rádios e se inscreveu como um mantra para os ouvidos da cultura pop, abrindo uma fissura entre o hard rock suado de Sunset Strip e a grandiosidade das baladas rasgadas. Era técnica, insistência, respiração e construção no fio do improviso.

 

Ao lado de Axl Rose, Duff McKagan, Steven Adler e Izzy Stradlin, Slash ajudou a fundar uma linguagem que flertava com o perigo, a sensualidade, a ruína. Mas com a mesma velocidade com que se projetaram ao topo, os conflitos internos e o desgaste os empurraram para o colapso.

 

Slash seguiu seu próprio caminho: projetos como Slash's Snakepit e Velvet Revolver reafirmaram sua busca por liberdade criativa em ambientes distintos, ainda que menos massivos. No Velvet, ao lado de Scott Weiland, houve algo próximo de uma continuidade — uma tentativa de costurar a energia dos anos 90 com o espírito que ele mesmo ajudou a moldar.

 

 

Nos anos 2016, o retorno ao Guns N’ Roses com a turnê Not in This Lifetime... reacendeu a chama dos grandes palcos. Mas agora sob outra luz: a de alguém que sobreviveu à própria mitologia. Em paralelo, suas colaborações com Myles Kennedy e The Conspirators mostraram um Slash mais contido, menos performático e mais concentrado na construção melódica. Um músico em constante deslocamento entre o peso do passado e a reinvenção possível.

 

 

Slash, aos 60, permanece em cena — não como um fetiche vintage, mas como agente ativo de uma história que ainda pulsa nos acordes, nos palcos, nos vídeos com a câmera girando ao redor do corpo arqueado e da cabeleira ocultando o rosto. Sua guitarra é a extensão do corpo, é uma linguagem que sobreviveu à obsolescência programada do pop, às dinâmicas da indústria e às narrativas fáceis sobre redenção.

 

Em tempos líquidos, Slash continua cortante. Não como símbolo congelado dos anos 80, mas como arqueologia viva de uma era que ainda busca sentido em riffs intermináveis e gestos ininterruptos. Aos 60, é celebrada a idade e a permanência. A resistência do som enquanto testemunho sem ponto final.

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