Se há uma data no calendário em que o rock parece ter passado por diversas camadas de renascimento e ruptura, esse dia é 23 de abril.
Uma data com o peso de nomes, álbuns e viradas que deixaram marcas profundas na cultura musical. Entre lançamentos emblemáticos, nascimentos de figuras fundamentais e registros que flertam com o sagrado e o profano do rock, o 23/04 é um ponto de convergência — e de dissonância criativa.
Ramones e a bomba punk que estourou o tédio
Em 23 de abril de 1976, quatro garotos de jaquetas de couro e jeans rasgados lançavam um disco homônimo que viraria um manifesto: Ramones. Na capa, eles posavam como se não dessem a mínima. Na agulha, menos de 30 minutos de faixas urgentes, agressivas, diretas.
Era o nascimento oficial do punk americano, um antídoto contra a superprodução do rock progressivo e a estética excessiva que tomava os anos 70. “Blitzkrieg Bop” e “Judy is a Punk” mudaram o jogo: agora, bastavam três acordes e uma atitude crua para dizer tudo.
Rolling Stones e os dois lados da moeda
No mesmo 23 de abril, mas cinco anos antes, os Rolling Stones lançavam Sticky Fingers (1971). Um álbum de transição e desejo, que marca a estreia do selo próprio da banda e traz um Jagger cantando sobre vícios, perdas e paixões dilaceradas. “Wild Horses” e “Brown Sugar” tornaram-se clássicos instantâneos, numa mistura de sensualidade e sujeira que resume bem a era Stones.
Cinco anos depois, em 1976, a banda retorna com Black and Blue, um disco mais errante, mais groove, que experimenta soul, funk e até reggae.
Uma banda gigante procurando novas formas de se manter relevante em uma década que já não era mais só sua.
Faith No More e a ruptura dos padrões
Em 23 de abril de 1987, o Faith No More lançava Introduce Yourself, seu segundo disco e o último com Chuck Mosley nos vocais antes da chegada de Mike Patton.
A banda ainda estava se moldando, mas já flertava com metal, rap, funk e um certo sarcasmo que depois se tornaria sua marca registrada. Um álbum pré-grito, em que a inquietação ainda estava tentando encontrar sua própria voz.
Bob Dylan, Elvis, Sid e outros delírios
Ainda em 23 de abril, mas em 1979, Bob Dylan registrava At Budokan, um disco ao vivo que dividiu opiniões. Era Dylan em fase elétrica, quase cabaré, revisitando suas canções sob outra estética — um artista que nunca quis ser um monumento, sempre um movimento.
Em 1978, Sid Vicious filmava sua versão de “My Way”, no que viraria um símbolo involuntário do niilismo punk.
Sinatra ganhava o punk spit em seu eterno smoking — mais uma colisão entre eras e estilos.
E bem antes disso, em 1956, Elvis Presley fazia sua estreia em Las Vegas. Um momento que ainda não era explosão, mas que plantava a semente do que viria a ser o culto a uma persona maior do que a própria música.
Roy Orbison, Jerry Adriani e o eco das vozes
Em termos de nascimentos e partidas, o 23 de abril também é data para lembrar Roy Orbison (1936), dono de uma das vozes mais reconhecíveis do rock melódico, e Billy Gould (1963), baixista do Faith No More, que ajudou a empurrar o rock para caminhos mais viscerais e imprevisíveis.
A data também marca a despedida de Jerry Adriani, em 2017, figura da Jovem Guarda que, embora distante do centro anglo-americano do rock, manteve viva no Brasil a chama do romantismo que ainda ardia entre guitarras distorcidas e ternos bem cortados.
O 23 de abril pulsa como uma frequência alternativa no calendário do rock. Um dia que não precisa de fogos para estourar, porque já está cheio de faíscas acumuladas entre discos, ídolos, colapsos e reviravoltas.
Uma prova de que o rock nunca foi uma linha reta — é um círculo vicioso de rebeliões, reinvenções e eternos recomeços.